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20.04.2022

Projeto Ágora: Entrevista com Nuno Sarafa (08/08/2021)

Radio Olisipo · PROJETO ÁGORA: NUNO SARAFA

Nuno Sarafa é baterista e percussionista, natural da cidade invicta o Porto. Colabora com artistas de renome na cena musical nacional como Joana Espadinha, Suzie & the Boys, Flak, David Fonseca, Sérgio Godinho, Jorge Palma, X-Wife, White Haus, We Trust, There Must Be A Place, Mirror People, Paulo Praça, Fat Freddy, entre outros. É também jornalista musical, ativo no âmbito da revista AS (Arte Sonora).

Em resposta à situação de atual emergência devida à pandemia do COVID-19 e à necessidade de promover iniciativas que possam avaliar e atenuar o impacto no âmbito das artes performativas, investigar os efeitos da crise, com enfoque no sector da música, documentar as estratégias aplicadas pelos artistas nas suas atividades criativas e de performance, o Projeto Ágora convida Nuno Sarafa, para compreender os efeitos provocados pela crise sanitária, quer no nível individual que no âmbito do sector cultural em Portugal.

Francesco: Olá Nuno Sarafa!

Nuno Sarafa: Olá!

Francesco: Bem-vindo aqui às conversas do Projeto Ágora, estou muito contente de poder conversar contigo, sobre alguns assuntos que têm a ver com a vivência dos músicos durante o período que estamos a viver ainda da pandemia, do confinamento, etc. Gostava que te apresentasses rapidamente!

Nuno Sarafa: Sim! O meu nome é Nuno Sarafa, tenho 44 anos, toco bateria, sou jornalista de uma revista de música e pronto a música é a minha vida! Basicamente, acho que resumo a apresentação daquilo que eu sou!

Francesco: Quatro palavras para dizer tudo! Eu gostava para começar, de saber de que maneira a pandemia afetou a tua situação financeira, desde o princípio das restrições e do confinamento?

Nuno Sarafa: Portanto, eu felizmente tive muita sorte também, a pandemia trouxe-me alguns desafios diferentes para a minha vida: estava habituado a tocar muitos concertos durante o ano, de 60/70 passei para 5 ou 6 no espaço de um ano! Quando a pandemia começou, eu sou já há muitos anos fã de podcasts, há muitos anos que adormeço a ouvir podcasts, então lembrei de fazer um podcast em vídeo nas primeiras semanas de confinamento, em que liguei a alguns amigos para lhes fazer uma entrevista acerca do disco da sua vida, então era uma conversa de 15 minutos à volta do disco da vida deste convidado em que depois eu editava aquilo com uns planos de corte e tal e pronto! e aquilo…

Francesco: …mas era uma entrevista áudio?

Nuno Sarafa: Era uma entrevista em zoom, no fundo foi aproveitar a tecnologia da moda do momento… e comecei a ligar a um a dois ou três, quatro amigos músicos, a falar sobre o disco da vida deles: pronto! E montei uma espécie de podcast que meti no iTunes e tal, pronto! Aquilo chegou a algumas pessoas, uma delas foi a diretora da revista Arte Sonora que me ligou a perguntar se eu não queria e… andou a ver o meu curriculum, tendo em conta que eu tenho formação em comunicação e sou músico, se eu não queria juntar os dois mundos, os dois universos e trabalhar com eles, não só para escrever mas também para fazer outro tipo de conteúdos como é o caso dos podcasts, em que tu entrevistas músicos e artistas, de vários quadrantes e tens ali um conteúdo semanal para apresentar. Portanto, no fundo aconteceu isto, que foi: eu comecei a fazer o podcast, passado duas ou três semanas recebi o convite para trabalhar com esta revista e ainda lá estou a trabalhar hoje. Portanto, a pandemia em termos financeiros não me afetou assim de sobre maneira, a não ser nos primeiros… um mês, dois meses, mas depois, na verdade… praticamente não a senti em termos financeiros… o que também me levou a tocar mais guitarra, levou-me a compor coisas, pronto! Todos os momentos em casa que tenho livres, tenho composto muita música, apesar de não ter… eu moro num apartamento e não tenho a minha bateria, eu sou baterista, mas tenho muitos instrumentos de percussão, tenho adufes, tenho algumas caixinhas e pandeiretas e pandeiros e shakers e… um diabo a quatro! Então, eu fui com um “microzito” registando coisas para musicar um livro que já ando a escrever a uma data de tempo, que também aproveitei o confinamento para, em vez de estar a ver televisão sentado no sofá… a produzir coisas que de outra forma, nunca tenho tempo para fazer. Portanto a pandemia, claro que traz um lado muito negativo, ainda por cima eu também fui infectado com Covid, mas trouxe-me uma abertura para a minha vida, em que fui procurar coisas que eu se calhar não tinha tanto, ou tempo ou às vezes vontade de fazer e que fui explorar: explorar novos caminhos de comunicação, seja ela com a música, seja ela com a escrita, com vídeo, portanto foi… no fundo, é um marco importante também, porque apesar de toda a desgraça mundial e à tua volta, quando sais de casa e vês as pessoas que eram duas ou três e agora são vinte na rua, isto tem um lado muito negativo, mas trouxe-me a mim em termos profissionais a artísticos, um lado muito positivo, que foi ir buscar mais coisas, procurar mais e ainda estar a fazer mais!

Francesco: Isto é fantástico! Quer dizer que a pandemia não te afetou em termos de criatividade?

Nuno Sarafa: Não! Pelo contrário! Aumentou… eu também gravei um disco pelo meio, em que tivemos obviamente que respeitar todas as medidas de seguranças. Fomos ao Namouche a gravar o disco novo de Joana Espadinha, em ambiente de pandemia, tudo fechado! Mas, isto foi um trabalho coletivo. Mas depois nas minhas horas de solidão em casa aproveitei.. epá! Com a minha guitarra, tocar horas à fio a guitarra, tocar muitos instrumentos, o piano, também tenho um piano em casa, que é a minha companheira que é pianista. Então fui explorar um bocado de coisas que normalmente eu no dia a dia não tenho, não é? É sempre tarola, os pratos e o bombo e umas notícias na revista… por isto a pandemia trouxe-me coisas. Pode parecer um paradoxo, mas na verdade trouxe coisas muito positivas para a minha vida!

Francesco: Em termos de performance, por exemplo, tiveste poucos concertos? Por exemplo se te perguntar se… em 2019 quantos concertos fizeste?

Nuno Sarafa: Em 2019 eu devo ter dado 50 e tal, 60… em 2020 dei 6! Portanto fiz… no início do ano, ali no primeiro trimestre 2 ou 3, depois tivemos… a partir de Março fechou totalmente e quando abriu mais ou menos no verão, ali nos Agostos/Setembro por ai… fiz mais 3 ou 4, cheio de medidas de seguranças, como é óbvio! Mas pronto! E aí sim! Percebi o valor de… eu já sabia disso, nunca tinha dúvidas: eu amo o que faço, sou um apaixonado pelo meu trabalho, mas quando voltamos a dar concertos, foi quando eu senti que eu preciso disto como de pão para a boca! é tipo uma coisa de…

Francesco: …que te alimenta?

Nuno Sarafa: Epá! Que alimenta a tua alma, não é? Não é só uma questão financeira, não é só… é muito da alma, que é uma coisa… nós fazemos isso há 30 anos! Deixas de um momento para outro uma coisa que é dada como garantida, deixas de a ter e a partir do momento que voltas a ter um “vislumbrezinho” disso, epá! Acho que valorizas de uma forma muito maior, acho que dei muito mais valor a estar com os amigos, a estar com os colegas, tocar música junto com outras pessoas e não estar em casa!

Francesco: Ensaiar, criar juntos…

Nuno Sarafa:  …exatamente! Porque é muito bonito, mas no sofá sozinho é uma coisa, numa sala de ensaio ou num palco com os teus amigos a tocar, é outra completamente diferente, não é?

Francesco: E em termos, por exemplo, para o futuro digamos próximo, se ficarmos nesta situação que é, digamos assim… determinada pela falta às vezes de perspetivas para os músicos, tu tens um trabalho também… mas estamos a falara gora…

Nuno Sarafa: …mas isto também não é garantido, não é? Não é nada garantido!

Francesco: Exato! Existe alguma estratégia, assim que pensaste: como fazer? Vista a falta de concertos, a falta de contato com o público, de programações culturais….

Nuno Sarafa: …claro! É assim, de alguma forma tem de acontecer alguma coisa, não é? Tem de se inventar novos conteúdos e novas formas de os apresentar. Agora temos aqui a questão dos live streamings, por exemplo, que eu compreendo que ela tenha que existir, porque o mundo não pode parar, a arte não pode parar, as pessoas precisam também de se alimentarem através da cultura, mas eu acho que isso em termos da parte do artista é sempre… é mais uma vez o prejudicado da cadeia: é que mais uma vez, a partir de um projeto de live streaming, quem ganha no fundo não é o artista, que está a trabalhar, está a dar o seu trabalho e a maior parte das vezes, não é exatamente bem compensado, percebes? E depois… e nada substitui como é óbvio o contacto físico e próximo com o público, não é? É um conceito, um paradigma completamente diferente, se vamos ter de fazer mais, se calhar vamos ter de fazer mais… tudo bem! Eu até agora fui sempre contra, durante a pandemia, nos projetos em que trabalho, quando surgiram as propostas de se fazer live streaming, eu disse: eu não faço!

Francesco: Ah ok! Te recusaste categoricamente?

Nuno Sarafa: Sim! Porque repara: ok! Eu vou e vai o baixista e vai o pianista e os sopros e tal, mas não vai o técnico de som, não vai a estrutura! São pessoas que também vivem de música, não são músicos e nem artistas, mas sem eles não existe música e nem arte a ser difundida para as pessoas e eu acho que: ou estamos todos ou não vai ninguém! Esta é aminha opinião! Se há condições, alugas um espaço, há dinheiro para pagar a todas as pessoas que estão a trabalhar, porque é muito bonito isto da arte e da cultura, mas para quem vê de fora e muitas vezes não percebe, acha que o pessoal está ali a curtir, não é? Que é uma diversão, é! Mas é uma diversão barra trabalho: isso é trabalho! E as pessoas de uma vez por todas têm de perceber que a cultura é trabalho! E não é uma cena de passatempo ou tempo livre que é para a maioria das pessoas que, epá! Para as pessoas do público, mas para quem a faz, não é! Portanto, ou tu crias condições para que tu consigas ter a tua equipa toda a trabalhar e a ser paga, para poder depois por comida na mesa, não é? Porque tu não pagas o supermercado com um estado de espírito! Ou há estas condições ou então eu acho que não vale a pena. Tem que se arranjar e rearranjar formulas para…

Francesco: …portanto, novas estratégias e pensar… porque haverá novas formas de apresentação musical de performance e tudo vai na direção do streaming…

Nuno Sarafa: …tudo vai nesta direção!

Francesco: Tudo vai nesta direção, como o teletrabalho e depois haverá também performance e apresentações online…

Nuno Sarafa: …tudo bem! Claro, mas também já, hoje em dia existem várias, não são nem 3 nem 4, existem muitas plataformas já que permitem tu emitir, transmitir em broadcast o teu espetáculo, mas a receberes… ou seja, através de um sistema de “bilhética”, em que as pessoas que querem ir ver o concerto

pagam um ingresso para assistir a aquela transmissão, que pode estar ou não disponível nas horas seguintes, mas pronto! Isto traz um problema: que as pessoas em Portugal já… a cena da borla é quase instituída, tu vais dar um concerto amanhã e tens meia dúzia de amigos a pedir-te uma entrada, portanto, isso também tens de combater um bocado… é que isso é uma faca de dois gumes, não é? Porque, ok! Tens aquela plataforma, vais fazer um espetáculo, vais fazer uma transmissão, mas depois vais ter público a pagar o bilhete? Pois, se calhar os grandes artistas se calhar têm, porque tem uma profusão e porque conseguem chegar a muitas mais pessoas! Um artistas independente não tem e mais uma vez o artistas independente, que é a maioria dos artistas que existem é sempre o mais prejudicado!

Francesco: Exato! Então o elemento central aqui é exatamente não oferecer…

Nuno Sarafa: …não pode oferecer! Nós Não podemos oferecer a nossa arte de borla!

Francesco: Ok! E em relação aos concertos, tiveste alguns concertos depois das restrições aqui em Portugal ou no estrangeiro assim… concertos onde sentiste que, ou seja concertos onde havia limites para o público e para os músicos, o uso da máscara, a impossibilidade de dançar, de se levantar…

Nuno Sarafa: …claro! Tive!

Francesco: O que é que sentiste?

Nuno Sarafa:  Senti uma frieza muito grande! Senti uma certa frieza, não é? A ausência total de contacto com o público, lembro-me de dar um concerto que tinha… que era num espaço que deveria dar para umas 5/6mil pessoas à vontade e estariam 500as ou 600as, sentadas na cadeira, cada pessoa sentada numa cadeira, distanciada da pessoa do lado 2 metros ou 3… epá! E senti do palco uma coisa completamente diferente! Muito feliz por estar a poder tocar outra vez, ao mesmo tempo uma sensação de muita tristeza, epá! Isto é uma pena de nós não podermos estar aqui a partilhar, não é? Aquilo que é o espetáculo ao vivo, que é uma partilha no fundo de um palco para o público e viceversa!

Francesco: A troca de energias, a comunicação…

Nuno Sarafa: …uma troca de energias, sim! É tudo: é mesmo uma fluidez de comunicação que existe, por isto, um artista em palco, muitas vezes ou a maior parte das vezes é influenciado por aquilo que sente vem da plateia e isso também interfere na sua própria performance, não é? E neste tipo de… com estas restrições isto não existe! Tu nem sequer sabes… as pessoas estão com uma máscara à frente, só vês os olhos, é muito estranho! Mas antes haver do que não haver, não é? Como é óbvio!

Francesco: Sim! É realmente algo… um universo completamente diferente a nível de performance… portanto, não sabemos no futuro como é que… o que é que poderá haver, quais os novos formatos… estes online, já discutimos que…

Nuno Sarafa: …é o que vai acontecer, não é?

Francesco: É o que vai acontecer, para ti? De certeza?

Nuno Sarafa:  Sim, isto vai acontecer! Não tenho dúvida nenhuma de que o formato live streaming vai ser uma cena que vai ficar!

Francesco: Um paradigma futuro… tem que se preservar o direito do artista a…

Nuno Sarafa: …sim! Tal como… exatamente como a máscara! Que hoje em dia se calhar, é para o ano, de aqui a dois anos, uma pessoa que tenha uma gripe eventualmente se calhar até vai andar com máscara, que é uma coisa que já existe em outros países, mas de uma forma geral na nossa cultura não existe. Mas se calhar isto veio para ficar e o live streaming é uma coisa que veio para ficar, concertos com distanciamento se calhar é uma coisa que veio para ficar, em vez de levar 10… é um sítio que dá para 10mil pessoas, pões lá três mil! Isto vai acontecer, acho que de uma certa forma vai… um regresso à normalidade, àquilo que nós tínhamos antes a 100%? Eu infelizmente, sou pessimista neste caso e não acredito que vai voltar a ser exatamente como era!

Francesco: Ou pelo menos em breve?

Nuno Sarafa: Sim! Em breve, nos próximos… no futuro próximo, 1 ou 2 anos não acredito! Acredito que vamos ter, vai voltar tudo, mas que vai ser devagar, com regras e não vai ser tudo de uma vez!

Francesco: Ok! Agora, queria perguntar-te por exemplo se tu, bom! Considerando que tens um trabalho, mas tiveste por acaso algum apoio do governo em relação à tua atividade de músico profissional?

Nuno Sarafa: Não! Não tive e esta é outra questão que é a questão da política cultural em Portugal: é historicamente muito deficitária, começa logo por não existir uma base de dados que agora, depois destes problemas todos já estão a criar através da universidade e a nível da parte política do Ministério, estão a criar uma base de dados que é para poder saber, que é fundamental, quantos é que somos? Quantas pessoas vivem da arte? Porque… trabalhos que tenham alguma segurança com um contrato de trabalho, não tiveram… não sentiram este impacto financeiro da pandemia, mas um trabalho que é altamente precário como o do artista, que é do recibo verde, que… tem trabalho, recebe… não tem? Não recebe! Que a maior parte dos artistas estão todos neste… fazem parte deste fenómeno, não é? E portanto, esse é o ponto 1 que é: saber quantos é que somos, onde é que estamos, quanto é que ganham, quanto é que fazem num ano, se precisam de apoio ou não… este é um ponto essencial! E depois claro, é uma coisa que é uma luta em Portugal há muitos anos, que é aumentar o orçamento do Estado para a cultura e que ainda por cima, é ridículo, não se está a pedir o 20%, esta se a pedir o 1% pelo menos? Percebes? Portanto em Portugal a cultura sempre foi um parente pobre, mas… sempre que temos um determinado tipo de cor política, nem sequer Ministério temos e depois quando temos outra cor política, para chamar os bois pelos nomes: quando está a direita no poder não tem Ministério, quando está a esquerda tu tens Ministério, mas mesmo assim não é eficaz, não é eficiente, não chega às pessoas! A cultura em Portugal é uma coisa muito… quase elitista, só por exemplo as companhias de bailado é que tem uma determinada ajuda ou são vistos como efetivos promotores da cultura, só que não é verdade, porque não são os únicos! Não é? Tu tens músicos independentes, artistas de rua, pintores, escultores, tens… pessoal do teatro, uma quantidade de companhias que trabalham de norte a sul e ilhas e que não tem o apoio do Estado! Mas há três ou quatro grandes que têm! E isto é um problema que é histórico e que é preciso mudar mesmo e nesse sentido acho que qualquer… todos os Mistérios da Cultura que Portugal teve em democracia, foram infelizmente e por muito que me custe dizer… epá! Não existe, é praticamente inexistente! Tu tens de te fazer à vida, por ti próprio, faz muito mais às vezes uma entidade como a GDA pelos artistas, do que o Ministério da Cultura!

Francesco: Incrível!

Nuno Sarafa: E isto é incrível! E é triste! É triste tu perceberes que vives num país que tem muita produção cultural, tem muita coisa boa aqui a acontecer, mas que não tem um apoio político que lhe permita evoluir: isto é muito simples! Um país como a França que tem política social para a cultura, como os intermitentes que deixam de ser intermitentes, naquele ano em que estás a construir um disco, não vais trabalhar para um supermercado, porque tu não vai ser um bom músico, ou um melhor músico se estiveres oito horas no supermercado e depois vais à noite ainda a fazer o teu disco? Não! Queres fazer um disco? Ok! Nós damos-te aqui um sustento durante estes meses para a produção do disco e depois tens de levá-lo para a estrada e provar que trabalhas e que o mostras e que o promoves e aí… passas a ter novamente direito, a quando precisares de parar? Tens um apoio! Isto faz de… isto é um apoio à produção cultural, isto faz com que a tua cultura seja…

Francesco: …e da criatividade!

Nuno Sarafa: E da criatividade, faz com que a tua cultura seja mais rica, que as pessoas tenham vontade de fazer, agora: tu teres de te desenrascares, que é aquela palavra típica portuguesa noutra área, desenrascares-te para poderes trabalhar no sector cultural? É triste! Devias ter condições para poderes trabalhar como noutra função ou em outra área qualquer da economia!

Francesco: Portanto, o que tu esperas dos políticos ou da política?

Nuno Sarafa: Não espero nada! Não espero nada! A única coisa que eu espero é entre nós, nós é que temos de nós ajudar uns aos outros!

Francesco: E nos unir?

Nuno Sarafa: E nós unirmos!

Francesco: E neste sentido, de alguns movimentos reivindicativos que nesta altura surgiram…

Nuno Sarafa: …sim! Estes movimentos são importantes e são tão importantes e falou-se tanto e gritaram tanto, que na verdade o Ministério da Cultura, por exemplo, foi fazer uma coisa que já devia ter feito há muitos anos, que é este levantamento, que é um censo dos profissionais da cultura, que não são só as atrizes, os bailarinos e os músicos, mas são os técnicos de som, são os técnicos de luz, são os roadies, são os motoristas, são os managers… é uma indústria gigante, que não parecendo é! Só que pronto! Portugal tem uma… tudo o que é festivais grandes, que trazem os nomes grandes do cartaz internacional e não sei o que… estes tem visibilidade e isto é que é a cena! Mas depois esquecem-se dos outros, que é maior parte, que é a formiguinha, que está aqui a trabalhar todos os dias e não sei o que! E que não desiste, a cena é: acho que é… o importante também é não desistir! Porque eu imagino e acredito que muitos colegas nossos e amigos… e isto sempre, lá está! Que é: não apoia estas pessoas, elas vão deixar de fazer isto, vão deixar de ser…

Francesco: …mudar de trabalho ou procurar…

Nuno Sarafa: …e tu vais perder uma panóplia gigante de know how, de pessoas que andam há 20/30/40 anos a aumentar a sua sabedoria e conhecimento na parte técnica, na parte artística e criativa e que vai deixar de existir…. estas pessoas… vamos voltar à idade da pedra! Vamos voltar aos anos ’80, não é? Em que ninguém sabia nada do que andavam aí a fazer, opa! Estou a falar aqui especificamente da parte técnica, por exemplo, que é uma coisa que é mesmo fulcral e tu vês muitos… eu conheço muitos amigos e se calhar tu também hás de conhecer, com quem já falei durante este período de confinamento, que me disseram: epá! Eu vou arranjar um trabalho, eu vou arranjar um trabalho e depois olha! Se isto voltar, depois eu vejo! Vais perder…

Francesco: …o problema é que depois… voltar para uma situação precária?

Nuno Sarafa: Já não vais voltar, não é? E as pessoas tem filhos e estás a perder massa crítica, know how,conhecimento, muito investimento, muito conhecimento… e isto, para isto eles não olham e é uma pena!

Francesco: Muito obrigado Nuno!

Nuno Sarafa: Eu é que agradeço!

Francesco: Foi um belíssima conversa, gostava de terminar a nossa conversa perguntando-te: não participaste a live streamings durante a pandemia?

Nuno Sarafa: Não participei!

Francesco: Mas participaste, digamos, a atividades criativas de grupo, tens alguma… gostava de perguntar-te se tens alguma sugestão de uma ou duas músicas que pudéssemos linkar a essa nossa conversa, para ouvir-te a tocar?

Nuno Sarafa: Olha, eu gostava muito de poder, mas ainda não temos pronto… de Suzie & the Boys, era bom! Mas não temos pronto!

Francesco: Mas por exemplo, nesta residência artística produziram algumas músicas, tem alguma música que gostavas por exemplo, um dia que fosse pronta ou uma gravação de ensaio?

Nuno Sarafa: Sim! Há um tema que eu gosto particularmente, que é um blues, assim uma toada mais calma, que tenho já estado a fazer assim uma escuta higiénica que me agrada bastante, o nome é que eu não lembro do tema… espera aí…

Francesco: …não faz mal! Meteremos depois…

Nuno Sarafa: …meteremos? Consegues chegar lá? Eu depois envio-te!

Francesco: Meteremos a indicação certa! E porque? esta música te desperta alguma…?

Nuno Sarafa: Não sei, transmite-me… logo que mal começamos a tocar este tema, transmite-me assim uma sensação de calma, uma paz e normalmente… pronto! Um gajo está sempre agitado, bateria e percussão e é tudo para frente… é tudo…

Francesco: …ou aquela frenesia às vezes de criar música de dança…

Nuno Sarafa: …exatamente! E às vezes esqueces-te que também precisas de uma música que só… sentes que fechas os olhos e que viajas e é isto que esta música me traz, que é viajar um bocadinho, viajar lá para trás! Viajar para um tempo que eu não conheço e que tenho muita curiosidade e gostava de ter conhecido, mas não conheço! Porque já foi há muitos anos e este tema em especial, transporta-me muito para ali, para a Nina Simone e Etta James e estas cantoras assim… que com alma, com soul, que nós tocam mesmo no fundo!

Francesco: Fantástico! Muito obrigado Nuno!

Nuno Sarafa: Muito obrigado eu, pelo convite! Obrigado!

Francesco: Foi um grande prazer, obrigadíssimo!

Nuno Sarafa: Obrigado!

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