Zoe Dorey – Mundo Novo (2022) (single)
Transe & Transe
Espiritual e carnal, o novo som de Zoe Dorey
Um disco nascido na pandemia, que inspira encontros
Há anos afastada de sua trajetória discográfica, Zoe Dorey volta batizando de “Transe” um novo álbum. O impacto de uma experiência espiritual profunda e a feliz exaustão de uma fase de intenso prazer sexual trouxe o título e ditou o conceito. “Transar é também entrar em transe”, diz ela, conectando os sentidos.
O álbum gerado e produzido no meio da pandemia, em uma cidade em outro continente, parece trazer uma atmosfera brasileira que inspira o encontro, seja espiritual ou carnal. Logo na primeira faixa, a carioca moradora de Lisboa canta: “Eu estou vendo/um mundo novo está nascendo/só pra gente se encontrar” (“O Mundo Novo”). E se o disco fecha com uma música sobre separação, é com certa maturidade que faz isso: “Meu amor agora é tarde/ Nos perdemos no caminho/Esquecemos que o amor escapa sozinho” (“Fim”).
Nas cordas da música brasileira
A forma como Zoe usa os elementos eletrônicos em sua música tem uma assinatura que é parte importantíssima da sua obra e em “Transe” não é diferente. No entanto, assim como antes, o trompete jazzístico, tocado por ela, tinha (e ainda tem) seu espaço de destaque, agora é o violão que chega junto sem qualquer timidez. O instrumento traz mais Brasil para dentro da música de Zoe. Ela chegou a ter aulas com Cezar Mendes – o violonista e compositor baiano já gravado por nomes como Caetano Veloso, Marisa Monte e Chico Buarque – o que possivelmente teve influência no caminho que sua música tomou. “Foi a melhor escola que eu poderia ter feito. Eu aprendi a mão direita através de músicas de GIl, Caetano, Joao Gilberto. Cezinha sabe tudo, é um gênio! E essas aulas me inspiraram a compor outras coisas. ganhei vocabulário e pude experimentar novos terrenos”, confirma ela.
As músicas
Entre o que Dorey realizou em alguns de seus álbuns anteriores e o ponto que agora está, “Rainha do Amor” (faixa 5), é o elo de ligação maior. As bases eletrônicas criam o clima, um Downtempo tropical. Por cima, o piano costurando uma bela melodia de claro DNA BR. A doçura da já citada “Mundo Novo” começa o disco de forma convidativa. “Bem Vinda” é a delícia pop do álbum. “Morena” parece nascida em alguma passagem inspiradíssima pela Bahia. “Shhh” é a cantada em inglês, mas é carregada da MPB “doreyana”. “Continente” acontece como uma bossa, só na voz e violão. Basta para arrepiar. Como única faixa não composta por Zoe, “Inquietação”, do cantautor José Mário Branco, é o som popular de Portugal convertido para o “Transe”. “Derreti” não tem pressa e sem ostentar vai como que sinuosa num clima de sensualidade. A reflexiva “Fim” fecha o álbum com uma atmosfera de intimidade com o ouvinte.
Para um disco cheio de delicadezas, a produção precisa entender o espírito da coisa. Foi o que fez Fred Ferreira, que produziu todas as faixas. O músico integrante da Banda do Mar veio para o projeto por meio de seu parceiro no trio, o brasileiro Marcelo Camelo, que além de participar em algumas músicas contribui de outras formas. Dorey conta como: “Ele é um dos homens mais delicados e dedicados que conheço. Mandei umas gravações voz e violão e ele me voltou com comentários importantes e sensíveis”.
A trilha percorrida
Zoe Dorey chega nesse “Transe” com bagagem e história consistente. Por exemplo: ainda usando o nome Claudia Dorey realizou a trilogia musical “Respire” (2009), “Inspire” (2014) e “Justpire” (2015). Entre um e outro, em 2012, se transformou em Malika e lançou “One”, uma experiência eletrônica ousada. Já produziu outros artistas, fez trilhas para teatro e cinema, trabalhou com nomes como Gerald Thomas e Denise Stoklos. O bonito é que tudo isso está presente, de uma forma ou de outra, nesse mais recente álbum.
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